limpeza, transparência,

London, 27 de Janeiro de 2020: Cheguei em Londres há quarto dias e desde então tenho sonhado intensamente e me lembrado desses sonhos tão vívidos diariamente. Todos os sonhos têm sido uma cópia fiel do que venho sentindo. E são muitos sentimentos e pensamentos embaralhados nessa última semana. Nessa noite, porém, meu sonho foi diferente. Sonhei com minha prima e um dos seus filhos, num contexto em que Freud e seus seguidores não teriam a menor dificuldade de interpretar. Nem eu, talvez.

Ela tinha um escritório num ultramoderno prédio, ao lado de outros também em construção. Eram tão modernos, tão estranhos, que era difícil encontrar a saída. Os prédios estavam em final de construção, no alto de um morro barrento, terroso, como se antes houvesse uma floresta for a devastada para abrigar aquelas estranhas construções. Um motorista atrevido estava designado para me levar para a cidade lá embaixo, mas ele não cumpriu seu papel, se mantendo numa postura independente e abusada. Esse era o cenário.

Mas o importante, o bonito, foi a emoção que nós duas sentimos ao nos encontrarmos. Um sentimento transcendental, fraterno, puro, impossível de descrever em palavras. Aliás, foi exatamente o que aconteceu quando nos encontramos nesse sonho. Nós não nos dissemos absolutamente nada e tudo estava dito e claro através dos nossos corações. Era só amor fluindo entre nós duas, sem nenhuma dor, sem nenhuma cicatriz. Em algum momento, o filho dela apareceu e aquele sentimento foi compartilhado a três.

Meu desejo era que aquele sentimento não terminasse nunca, eu não queria acordar daquela experiência. Tive a clara sensação de que aquilo ali não tinha sido apenas um sonho, que tínhamos realmente nos encontrado numa outra dimensão. Proust escreveu que os sonhos deviam contar como vida vivida. Os sonhos agradáveis, claro. Eu acredito piamente nessas conexões invisíveis. Muitas pessoas acreditam e têm

diferentes interpretações para isso, interpretações de cunho místico, científico ou racional. Em Sense8, o seriado criado por Lilly e Lana Wachowski, as personagens se conectam em outra dimensão. Gosto dessa ideia. Minha sensação nesse sonho foi muito parecida.

Aqui, no mundo dito real, nossa relação está ferida, rasgada, machucada. No meu mundo real é só amor, como no sonho, ou nessa outra dimensão onde o ego e as coisas do mundo palpável não interferem porque simplesmente não existem.

Mais tarde, vi uma foto dela com três ou quatro anos. Me lembrei de uma foto minha com a mesma idade. Imaginei aquelas duas meninas alegres e imaculadas brincando, sem culpas ou julgamentos. Meu sentimento por você, prima, é só amor.

Não sei se queria que o tempo, essa ilusão que está impregnada na gente como se fosse verdade, voltasse atrás para modificar os fatos da vida palpável. Acredito que os fatos são energia materializada. E nas relações não existem energias unilaterais. O que se materializou estava invisível, não estava dito, mas estava lá o tempo todo. Por isso, no mundo palpável, é importante falar sobre os sentimentos com sinceridade.

O que eu quero dizer, do fundo do meu coração, são aos frases do Hoponopono: eu sinto muito, me perdoe, te amo, sou grata. E digo isso intensamente, de dentro pra fora. Desejo profundamente que os fatos dolorosos sejam degraus para o aprofundamento desse amor que um dia nos aproximou e nos uniu, sem feridas abertas. Porque em algum tempo não seremos mais esses seres humanos palpáveis como somos agora. Mas ainda nos restará o Amor.

Chamo de fluxo de consciência o que a psicanálise chama de associação de ideias. Seja escrito ou gravado (áudio ou áudio-visual). Uma livre associação não só de ideias mas principalmente de sentimentos e emoções. Essa associação faz parte do meu processo criativo e de autoconhecimento.

O que mais me empolga é o fluxo de sentimentos que tenho ultimamente quando estou despertando. Acordar, para mim, é um processo longo. Me dou tempo de meditar, me inspirar e me centrar antes de levantar da cama.

Há alguns anos, minhas inspirações surgiam quando eu estava lendo e quase adormecendo. Queria poder escrever meus sentimentos. Mas se eu voltasse ao estado de alerta para escrever a inspiracao se dissipava. Com a mesma facilidade com que se dissipam os sonhos ao acordar. Então aqueles insights atravessavam a leitura até se sobrepor completamente e eu cair no sono. Ou no sonho, outra forma deliciosa de entrar em contato comigo mesmo.

Também pratico um processo de fluxo de consciência, esse no estado de alerta, que chamo de labirontoautobiografia. Esses são processos de busca ligados ao meu Eu interior, inconsciente, não ao meu ego.